(interlúdio)

by João Abreu

éden

  Porquê, ninguém me responde, Porquê, ninguém quer saber, serei o único a compreender, é impossível não verem o que se está a passar, este sítio, o estado em que ele se encontra, acham mesmo que conseguem fazer voltar tudo ao que era? O passado já foi, e foi o que foi – levou-nos à situação em que nos encontramos hoje – e ainda assim querem-no tanto, chamava-lhe de estupidez mas é algo mais, não é que não saibam, simplesmente não querem saber, convém-vos a ignorância…

  Já passei a negação, nunca a tive, nunca vi outra realidade que não esta, desconheço algo melhor, mas a solução, ou será que se pode mesmo chamar de isso, é fugir, é sair, é esquecer, mas a esperança tolda-vos e impede que verdade seja concretizada. Talvez um dia, talvez noutro, quem não tem mais espaço para néscias ambições sou eu, que quero algo bem mais plausível do que a vossa adorada quimera.

  Disparates intragáveis, ainda se dão ao trabalho de atribuir culpas, estejam descansados, se não fossem eles eram vocês, era uma meta inevitável esta que colocaram à vossa frente, fiquem contentes, Deus escolheu-vos para assumirem este compromisso; são os preferidos dele, fiquem contentes, fiquem contentes…! Incuráveis idiotas, ainda neste momento rezam a um tal de Senhor para que vos livre de tudo isto, pois fiquem sabendo, estão a rezar pelo vosso enterro, e admito que não sei o que seria melhor, que a divindade invocada se cumprisse ou que não.

  Abram os olhos e vejam a miséria, vejam os resultados das nossas acções e consolem-se ao pensar que ao menos não foram vocês a causar tudo disto, que não tiveram qualquer parte na pintura deste mapa cinzento, ou castanho, porventura ambas, e durmam descansados por mais um dia, pelo menos até terem que repetir o mesmo ritual. É por isso que muitas vezes me falam de como era o mundo, dizem até que o conseguem ver de vez em quando, só se for em sonhos, por mais que olhe vejo sempre o mesmo, têm pena de mim, e eu deles, não há mais espaço na Terra para sonhadores, se já não o há para sonhos.

  Não há nada para mim aqui. Os desejos que guiam estas pessoas perdem-se em mim, e os que me guiam perdem-se neles, não cobiço por mais tecnologia, não espero uma solução vinda de exactamente aquilo que nos trouxe até este ponto, quero somente sonhar, não por tempos melhores, mas piores, pelo hoje, pelo ontem; já cá não estaria eu…